quarta-feira, 25 de junho de 2014

o escrito















não me afeiçoo às letras em si
mas à névoa incessante que paira diante dos meus olhos
como um peso morto pendendo no meu pescoço
e só um único gesto de tremor
rasga essa cortina fumegante.
assento as páginas mal escritas enquanto fujo
dos dardos em fogo disparados pelos nódulos da confusão.
enquanto corro vejo claramente,
como a tensão é a matéria que germina na criação.
o tempo, enclausurado na insónia,
é o fruto vermelho de quem escolheu o vício- absurdo este-
de provar as cinzas da própria combustão.
às vezes, não me afeiçoo às palavras em si,
mas ao silêncio calmo que fica, depois da caçada.
iolanda oliveira

quinta-feira, 5 de junho de 2014

quando amanhece, já não sei quem sou


















Parece que ando a dormir com os lobos, 
tudo não faz sentido, fecho os olhos
sinto-me tão pequena, a lua
cheia de crateras e mares e oceanos
                                          não interessa. 

Desaprendi de chorar quando soltei o primeiro uivo
nas àrvores que tinham buracos nos troncos
como nós. 

A saliva escorre das nossas bocas.
desaprendi de mim quando me escrevi em pedra
as promessas que faziam sentido
e tudo agora
                                          não faz. 

A neve gira e gira e gira em torno dos nossos flancos
quando arrefecemos 
e escutamos o som do tempo a passar nos nossos pulsos
dois corações
e meia vida.

Uivas à lua como se ela brilhasse em mim
é tarde quando se solta a tua besta e te rasga o ar
há algo que se dissipa da tua natureza.

Não tenho medo.
guardei os anos dentro de um poço
quando nada fazia sentido e agora tudo
                                          não faz.

iolanda oliveira